SUPERAR SORRINDO: LIÇÃO DA BIBLIOTECÁRIA.
- obomdemossoro
- 6 de out. de 2015
- 5 min de leitura

SOLANGE ROCHA DE CASTRO
A vida não é só de alegrias, mas também não é só de tristezas. Ela é um aprendizado contínuo, que exige sabedoria para não nos envaidecermos nos momentos bons, nem desistirmos nos momentos difíceis. Sorrir e superar, seja qual o momento for, é a lição de vida que a professora e bibliotecária Solange Castro nos deixa ao expor sua história para os leitores do O BOM DE MOSSORÓ. Nascida em Mossoró em 16 de fevereiro de 1966, a segunda dos seis filhos do casal Francisco Fernandes de Castro e Maria Zilda Rocha de Castro lembra que quando criança, muitas vezes, pegava um livro e se escondia atrás da porta para ler. “Se não fizesse isto, minha mãe poderia me mandar fazer alguma tarefa doméstica, pois para ela, sempre tinha algo a ser feito em casa”, justifica. Ela era a filha mais velha, portanto, tinha que ajudar em casa, pois a família numerosa sobrevivia apenas do trabalho do pai no Departamento de Estradas e Rodagens/RN e não poderia se dar ao luxo de contratar uma colaboradora doméstica. Chegou uma hora em que seu Fernandes também colocou uma oficina mecânica em casa, no conjunto Walfredo Gurgel, dando conta dos serviços no turno noturno. “Aos 38 anos, de tanto trabalhar, meu pai teve um Acidente Vascular Cerebral (AVC), o que fez com que se aposentasse por invalidez”, conta Solange.

O CASAMENTO E O DRAMA DA SEPARAÇÃO – Seus estudos Solange fez quase todo na escola estadual Elizeu Viana. Apenas a alfabetização foi na extinta escola estadual Martin Luther King. No seu primeiro vestibular, foi aprovada para o curso de Letras da UERN, fazendo anos depois especialização em Leitura. Nem imaginava o quanto seu amor aos livros, vindo desde a época em que comprava livros através do ‘Clube do Livro’, comprados com as moedas que o pai lhe dava, serviria para suas atividades futuras. Solange já era funcionária pública estadual na área administrativa da educação antes mesmo de concluir o curso de graduação, e quando se tornou professora, em 1988, logo assumiu sala de aula na rede municipal com a disciplina Língua Inglesa. Após se afastar por um tempo devido problemas nas cordas vocais, retornou para ensinar Língua Portuguesa, o que fez ainda durante um ano no colégio Sagrada Família. Também ensinou no CCAA, em uma experiência de um ano. Enquanto isto, seu pai havia se recuperado do AVC e, inquieto, abrira uma funilaria no bairro Bom Jardim, para onde toda a família se mudou, e uma loja de peças no bairro Paraíba. Três dos irmãos trabalham hoje nestas empresas: Sérgio, Suayde e Sinara. Já Sodré é farmacêutico e Celeneh, funcionária da UFERSA. Em 1992, Solange casou com o professor de educação física João Vicente Gomes da Costa, com quem teve Marília de Castro Gomes, estudante de jornalismo na UERN, e João Lucas de Castro Gomes, concluinte do ensino médio. Esta relação durou 14 anos, até o dia em que ela foi surpreendida com o pedido de separação, pois Vicente havia se apaixonado por uma colega de trabalho. O drama do abandono durou mais de um ano na cabeça da professora, tempo de desânimo, tristeza e sofrimento. “O mundo parecia que tinha acabado para mim. Viver já não tinha sentido. Fui me recuperando do trauma lentamente, ao ponto de hoje ter uma relação de amizade com meu ex. Percebi que meus filhos não tinham um ‘ex-pai’ e não mereceriam que eu colocasse algum obstáculo na relação entre eles”, conta.

NOVO DRAMA, NOVA SUPERAÇÃO – Solange diz que o amor próprio lhe ajudou a superar aqueles momentos difíceis, decidindo dar expediente no período da tarde na loja do pai. À noite trabalhava para o estado e pela manhã ensinava no município. Tudo normal em sua vida até fazer, em 2012, seus exames de rotina. Um câncer de mama em estagio inicial foi detectado, e mesmo recebendo a notícia de que as chances de cura eram, naquela época, de 87%, Solange ficou paralisada e sem voz. Abalada, contou com o apoio da família para enfrentar o que viria pela frente. Fez logo a cirurgia necessária e iniciou os tratamentos de quimioterapia e radioterapia. “Tinha dias que eu queria desistir. Chegava de cadeiras de rodas ao centro de Oncologia. Depois das quimios chegava há passar dez dias acabada, só viva. Foram nove meses de tratamento intenso em busca da saúde. Até hoje faço monitoramento e tomo remédios preventivos”, relata. Em 2014, finalmente, foi liberada para voltar ao trabalho, retornando a sua querida escola municipal Duarte Filho, e pensando que voltaria a dar suas costumeiras aulas. No entanto, também por recomendação médica, Solange foi encaminhada para dar expediente na biblioteca da escola. “Não fiquei nem um pouco satisfeita, pois tinha em mente que essa função era para professor encostado e sem utilidade. Depois que assumi, passei uma semana muito chateada e quando chegava em casa só chorava”, lembra.

CRIANDO UM MUNDO MÁGICO NA BIBLIOTECA – Até então, a biblioteca da escola era vista como um lugar de castigo, onde os alunos que cometiam alguma indisciplina eram direcionados. Solange mesmo lembrava-se de quando levava seus alunos para lá achava um espaço sem graça, cheio de regras: não podia fazer barulho, não podia retirar os livros para não desorganizar, não podia levar mais de um livro, entre outras. Aos poucos foi percebendo que podia modificar aquele espaço, começando por expor os livros que encontrou trancados nos armários. “Eram guardados para não haver o risco de desaparecerem”, conta. Depois separou os livros nas estantes por gêneros e em cada gênero colocou uma diferente cor de etiqueta. “Assim facilitava tanto para mim quanto para os alunos. Descobrimos verdadeiros tesouros”, recorda. Tudo devidamente separado, Solange começou a abordar os alunos nos corredores, nas salas, convidando-os a visitarem a biblioteca. Eles passaram a frequentá-la mais, conversando com ela sobre livros que já tinham lido. “Nessas conversas fui descobrindo quais gêneros eles mais gostavam. Surpreendi-me com o conhecimento que muitos tinham a respeito dos livros best-sellers, principalmente as trilogias. Selecionamos alguns títulos e levamos à feira do livro, adquirindo alguns dos sugeridos. Hoje temos uma lista de espera, eles ficam monitorando os empréstimos, quem tem o livro tal, quem está em atraso na devolução, e isso me deixa muito feliz”, descreve. Procurando várias formas de incentivar à leitura, ela deixa de propósito revistas e jornais espalhados pelas mesas para que os alunos folheiem e até façam comentários sobre as matérias. “Outro incentivo que criamos foi o Prêmio Leitor Pra Valer. A cada bimestre faço o levantamento do livro mais lido na escola e também o aluno que mais leu no bimestre. Com recursos próprios, presenteio o Leitor do Bimestre, lógico, com um livro”, explica Solange. Hoje a biblioteca tem muitos frequentadores assíduos, tem movimento, vida, alegria, descontração. Lugar onde os alunos podem entrar para ler ou não, escolher o livro que quiser e, se não gostar, desistir e pegar outro, bater papo e acima de tudo adquirir muito conhecimento. Solange transformou o lugar onde trabalha da mesma forma que a sua própria vida: superando as adversidades com um sorriso no rosto, fazendo tudo com fé, amando o que faz e agradecendo por ter se tornado a mulher corajosa e guerreira que é.

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