SUBLIME É O AMOR, SEJA QUAL FOR.
- obomdemossoro
- 15 de ago. de 2015
- 4 min de leitura

MARIA HELENA SIRIO MARQUES
No último dia 05 de julho as amigas Maria Helena e Ramiria da Costa decidiram assumir seus sentimentos uma pela outra. Mas não foi uma trajetória fácil para nenhuma das duas. Ramiria estava voltando de São Paulo após seis meses em casa de parentes, para onde foi com um único objetivo: declarar sua orientação sexual à família, principalmente à mãe, que ficara no município de Lucrécia. “Estando longe, criei a coragem necessária para contar, por telefone, que não estava exatamente inserida nos padrões da sociedade. Foram duas horas na linha para que minha mãe entendesse que esta era uma realidade, não uma doença que precisaria ser tratada”, conta.
O dilema interior de ter a obrigação de revelar ao mundo o próprio sentimento, intensificado pela pressão que a sociedade ainda exerce sobre a homossexualidade, quase sempre causa momentos de traumas e aflições entre a pessoa e seus familiares e amigos. A aceitação natural ainda é uma atitude rara, como se o amor entre duas pessoas do mesmo sexo fosse diferente do amor sentido entre duas pessoas de sexo opostos. A história da adolescente Heninha, como Maria Helena é chamada por muitos, retrata bem o caminho de dor e sofrimento pela qual a maioria das pessoas nesta mesma condição passa, quase sempre por anos a fio.

DETERMINAÇÃO É A ARMA NATURAL – Nascida em Mossoró em 02 de julho de 1996, Heninha se mudou com a família ainda no seu primeiro ano de vida para a cidade de Assu. Por lá estudou no Jardim Escola Caminho do Futuro, no Complexo Educacional Instituto Padre Ibiapina CEIPI e na escola estadual Juscelino Kubitschek. Foi uma aluna que ‘aprontava bastante e não era tão aplicada, apesar de gostar de ler e se considerar inteligente’.
“Sempre tive muita facilidade em aprender, absolver os ensinamentos apenas no ato de prestar bem atenção. Isso me ajudou a ser perspicaz em relação às situações da vida, procurando ser mais ouvinte, evitando brigas desgastantes. Mas o que nunca aguentei foi as tentativas de me proibir de fazer algo. Quando isso acontece viro uma fera”, diagnostica.
Quando teve a certeza de sua preferência sexual, namorava meninos apenas para dar à mãe a satisfação necessária, como que adiando uma revelação inevitável. No entanto, nada impediu o despertar das naturais desconfianças de uma mãe atenta, que cada vez mais procurava cercear sua liberdade, a pressionando a ser uma prisioneira de se mesma.
Aos quinze anos, já não aguentando as pressões a que estava submetida, Heninha decidiu fugir com seu primeiro namorado após uma briga familiar. “Ele só topou porque era profundamente apaixonado por mim”, conta. Esta primeira fuga só durou quatro dias. Preocupada com a saúde da mãe, decidiu voltar para sua casa. O pai, contrariado com a situação, demonstrava não aceitar a condição da filha, e quando bebia, rasgava para quem quisesse ouvir seus sentimentos.
Pouco tempo depois, no retorno de uma viagem onde os dois jovens haviam feito juntos, a moto em que estavam apresentou problemas e os celulares não conseguiram sinal. Impossibilitados de avisar as suas famílias, decidiram, novamente, morar juntos e assumir uma independência necessária. Desta vez a ‘brincadeira’ durou dois anos e 15 dias. “Neste período pude viver com mais liberdade e da forma que eu achava possível. O relacionamento com minha mãe foi amadurecendo e ela pôde entender melhor minha condição. Até que um dia resolvi retornar ao convívio de minha família, mesmo com a insistência de meu namorado em ficarmos juntos”, descreve.

LIBERDADE E FORÇA INTERIOR – Continuaram a existir algumas dificuldades de relacionamento familiar, mas agora com maior dose de aceitação por parte dos pais. O amor pela filha permitia que uma brecha de compreensão permanecesse aberta naquele lar. Quatro meses se passaram até aparecer uma oportunidade de emprego em uma empresa de telemarketing de Mossoró. Heninha conseguiu sua vaga e veio morar na casa de sua avó paterna.
Procurou deixar seus maiores problemas em Assu e iniciou uma nova etapa de vida. No entanto, os primeiros meses não foram fáceis. Sentia saudade do companheirismo da mãe e medo de novamente magoar o pai. Aos poucos, buscou se reequilibrar socializando-se mais com os novos amigos e começando a ter relacionamentos mais consistentes, carinhosos e que lhe trouxessem amadurecimento, inclusive com homens. “Eu busquei segurança, alguém para dividir meus conflitos e me ajudar a conhecer melhor quem eu era de verdade”, lembra.
A paz maior veio com a chegada de sua companheira atual. Conheceu Ramiria através das redes sociais e foi com ela criando uma amizade consistente, sentindo algo bom que só fazia crescer a vontade de estar juntas. “Quando nos conhecemos, ela era tímida demais, ficava vermelha, baixava a cabeça e conversava pouco. Hoje já até briga comigo quando necessário. Temos confiança, carinho e respeito uma pela outra, conversamos bastante e nos entendemos nas ideias. Quando não estamos perto logo sentimos uma sensação de angustia. É um amor que em nada se diferencia do que minha mãe sente por meu pai, e tenho certeza do que ele também sente por ela”, explica.
Para Heninha, o mundo precisa de mais gente com coragem para enfrentar os reais problemas sociais, e não para tentar resolver os problemas do próximo. “O preconceito é desnecessário, atrasa a humanidade e nada constrói. Muitos sofrem com julgamentos e pressões psicológicas apenas porque outras pessoas acreditam superiores ou acham conhecer a razão da existência. O mundo me fez forte, e nesta fortaleza enfrento as situações que forem necessárias para ser uma pessoa feliz e realizada”, finaliza.
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